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Vacinação que pode ser fatal

Compartilho nesse blog minhas experiências,  notícias interessantes sobre a área Veterinária. E eu não poderia de chamar atenção de uma situação que foi publicada pela revista DBO, que não é apenas o "modus operandis" vacinal na fazenda feito pelos vacinadores pode estar errôneo e equivocado, como também as vacinas podem estar contaminadas ou com excesso de adjuvantes que levam ao quadro descrito nesta matéria. Tive oportumdiade de ver tal situação in loco, novamente, e chamo atenção dos colegas e dos laboratórios para esse fato.
Vacinação que pode ser fatal

"Perguntei ao proprietário da fazenda em que local costuma vacinar seus animais. Ele me respondeu: onde der”. O diálogo, breve, foi como “clic” revelador para o veterinário Gustavo Rodrigues Queiroz, professor da Unopar - Universidade Norte do Paraná, sediada em Londrina.
Ele havia sido chamado para investigar as causas de um surto de incoordenação motora em uma fazenda em Borrazópolis, a 130 km de Londrina, e não conseguia encontrar a origem do problema. Dez bovinos machos do rebanho da propriedade, entre Nelores e cruzados, com aproximadamente 30 meses de idade, apresentavam andar cambaleante e fraqueza nas pernas posteriores, em diferentes intensidades. “Cinco deles evoluíram posteriormente para decúbito lateral permanente (deitaram de lado) e morreram em 15 dias”, relata.
Como se verá mais adiante, o problema estava relacionado justamente com o local da aplicação da ­vacina. Inicialmente, Queiroz desconfiara de que fosse raiva, a doença inflamatória do sistema nervoso central que mais mata bovinos no Paraná, seguida de perto pelo Herpesvírus Bovino Tipo 5. Essa suspeita, no entanto, foi descartada: “A raiva é uma enfermidade que se agrava de modo muito rápido. Em dez dias, normalmente o animal já está morto, o que não aconteceu na fazenda em Borrazópolis. Queiroz redirecionou, então, suas investigações para as plantas tóxicas, hipótese logo descartada, pois os exames de sangue não apontaram nenhum sinal de intoxicação. O botulismo, doença muito comum nos Estados do Centro-Oeste, tampouco era o vilão da história, como mostrou a ausência de toxina botulínica nos conteúdos gástrico e intestinal.
Já haviam se passado 60 dias desde o início do surto, em princípios de dezembro de 2013, quando Queiroz questionou o produtor sobre o modo como ele vacinava seus animais. “Na hora me deu um estalo. Pensei: tem caroço nesse angu”, conta o veterinário, referindo-se à hipótese de que o problema fosse causado pela aplicação da vacina em local incorreto (na medula do animal). Essa suspeita ganhou força depois que ele observou as instalações da fazenda. “O curral era muito antigo e estava em péssimo estado de conservação. Os animais eram vacinados no brete, não havia tronco de contenção individual”, relata.
A investigação ainda revelaria uma realidade estarrecedora, mas não exatamente destoante do cenário nacional: todo o rebanho da propriedade – neste caso, 800 animais - era vacinado contra a febre aftosa num único dia (no Paraná, a etapa de novembro é obrigatória para todas as categorias).
Algo que, para o professor Mateus Paranhos, especialista em bem-estar animal  e coordenador do Etco, Grupo de Estudos e Pesquisas em Etologia e Ecologia Animal da Unesp-Jaboticabal, é totalmente descabido. “Na minha opinião, não é possível realizar um bom procedimento de vacinação quando se trabalha com esse número de animais por dia. Isso aumenta o risco de acidentes e prejudica a qualidade do serviço”, justifica. (veja quadro com as orientações do professor de como proceder)
Direto na medula
Membro de um grupo de estudos que há sete anos se dedica ao diagnóstico de animais com sintomatologia neurológica, capitaneado pelo pesquisador Júlio Lisboa, professor da UEL (Universidade Estadual de Londrina), Gustavo Queiroz consultou publicações científicas em busca de casos semelhantes. Deparou-se com o que já suspeitava: dois relatos de surtos de compressão medular associado à vacinação contra a febre aftosa. De volta à fazenda em Borrazóplis, sacrificou um novilho Nelore que estava com o problema e perto do peso de abate e pôs-se a investigar. A necrópsia acabou com o mistério: “Examinando a coluna vertebral na região compreendida entre as vértebras torácica e lombar, mais precisamente na altura entre a L3 e a L4, encontrei um granuloma (nódulo) dentro do canal vertebral, que havia se formado em decorrência da vacinação incorreta, o que comprimiu a medula e provocou a lesão.”
Granulomas inflamatórios são reações normais que acontecem após a vacinação, devido principalmente à presença na vacina de adjuvantes oleosos, compostos que potencializam a intensidade e a duração da resposta imune do animal. Quando a dose é aplicada no local correto, o granuloma não passa de uma leve saliência, que desaparece naturalmente alguns dias após a vacinação. “No caso dos animais que apresentaram incoordenação, a aplicação foi desastrosa, diretamente na medula”, afirma Queiroz. As lesões ocorreram em graus variados, por isso havia animais com diferentes quadros de incoordenação. Erros de manejo na vacinação normalmente costumam cobrar sua fatura na forma de perda de rendimento de carcaça (devido à retirada de abscessos), mas dessa vez condenaram o animal à morte.
O problema registrado em Borrazólis é mais comum do que se pensa. No município de Olho D´água, região oeste da Paraíba, outro produtor sofreu perdas devido à vacinação incorreta. Incomodado com os granulomas formados após a aplicação do medicamento, ele tomou uma decisão inusitada e temerária: passou a vacinar os animais na região lombar, em vez de no terço médio do pescoço, como é recomendado. Esse “novo método” havia se tornado uma prática rotineira na região, por mera questão estética. A médica veterinária Ana Luísa Alves Marques, doutoranda da UFCG (Universidade Federal de Campina Grande), conta que os produtores “não queriam ver seus animais com saliências no pescoço”. Ela percebeu o fato quando foi chamada para averiguar os primeiros casos de incoordenação motora na fazenda daquele produtor.
Na via-crucis para o diagnóstico, o mesmo roteiro: raiva, botulismo, intoxicação por plantas tóxicas. Tudo descartado. A resposta veio depois que um bezerro de sete meses, que apresentava debilidade acentuada dos membros pélvicos, assumindo a “postura de cão sentado”, foi encaminhado ao Hospital Veterinário da UFCG. O exame físico revelou um aumento de volume de aproximadamente 8 cm, quente e indolor, na região lombar. O proprietário confirmou que havia feito a aplicação da vacina contra febre aftosa no local.
O bezerro permaneceu internado durante 15 dias, sendo submetido a tratamento com antibióticos, anti-inflamatórios e compressas mornas no local do inchaço, que reduziu de tamanho, porém sem melhora no estado clínico geral. O quadro se agravou e o bezerro precisou ser sacrificado.
Diagnóstico: “Lesão medular secundária à compressão por granuloma vacinal”. Dos outros cinco animais da propriedade acometidos pelo mesmo problema, um morreu afogado em açude após cair na tentativa de beber água e não conseguir se levantar. Outros quatro sobreviveram, mas com sequelas. “Mancavam, não conseguiam se locomover direito”, relata a veterinária. 
Informar para prevenir
Para Ana Luísa Marques, da UFCG, a informação é a principal arma para que se evitem novos casos. “É preciso difundir o conhecimento, de modo a evitar a aplicação da vacina próximo à coluna vertebral”. Foi o que ela fez a partir de então. Ana explica que a saliência formada após a vacinação é provocada pela saponina, um adjuvante imunológico presente na vacina contra febre aftosa. Adjuvantes retardam o processamento dos antígenos pelas células, aumentando seu período de contato com o sistema imune e, consequentemente, melhorando a resposta imunológica. “Os veterinários explicam que o adjuvante faz com que a vacina proteja os animais por mais tempo e que a questão estética tem pouca importância”. Segundo ela, o trabalho de conscientização tem surtido efeito. “Muitos produtores já deixaram de adotar a conduta errada”.

Vacine no local correto

Segundo o professor Mateus Paranhos, a vacina contra a febre aftosa deve ser aplicada preferencialmente via subcutânea. O local indicado é a tábua do pescoço. "Deve-se puxar a pele e posicionar o conjunto seringa e agulha paralelamente ao corpo do animal, de modo a minimizar o risco de atingir o músculo", explica. Sempre que possível, após a retirada da agulha, o produtor deve fazer uma leve massagem circular no local da aplicação, para evitar o refluxo (quando a vacina escorre pelo orifício deixado pela agulha). É importante realizar a operação com o animal contido, preferencialmente em um tronco de contenção individual.

O manual de boas práticas de vacinação do Etco recomenda uma equipe de trabalho, corretamente posicionada: uma pessoa na porteira de entrada, outra para fazer a contenção do posterior do animal (quando necessário) e uma terceira, na porteira de saída, na pescoceira. "Antes de imobilizar o animal, feche a porteira dianteira do tronco de contenção, e, somente depois, contenha-o com a pescoceira", diz Paranhos. Com o animal contido, aplica-se a vacina. Na falta de um tronco de contenção individual, é ainda mais importante realizar o trabalho com cuidado, sem correria.

Prática comum nas fazendas, a vacinação no brete deve ser evitada, pois traz uma série de consequências desagradáveis. Animais mais reativos sobem sobre os outros. Há reses que tentam pular sobre as laterais de madeira e outras ainda que não aguentam a pressão, deitam e são pisoteadas. Não raro, os animais se machucam e ocorrem sangramentos no local da vacina, com formação de abcessos. Há ainda o risco de fraturas e até mesmo morte, principalmente de bezerros.

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